A sociedade brasileira tem sido submetida a uma agenda regressiva no plano político e social, que se expressa num conjunto de projetos de lei, emendas constitucionais e medidas provisórias que atacam direitos constantes da Constituição de 1988. Este é o caso da imposição de agendas privatizantes ao ensino superior e à pesquisa pública por meio da Lei 13.243/2016, denominada “Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação”.
Análise criteriosa da referida lei mostra ter sido urdida com a participação de parte da comunidade científica, sobretudo dos ditos “acadêmicos empreendedores”, que somaram forças com empresas privadas na busca de flexibilizar o Complexo Público de Ensino Superior e de Pesquisa Brasileiro, com o objetivo de se apropriarem de maior parcela dos recursos públicos gastos em Pesquisa de Desenvolvimento (P&D).
A Lei 13.243/2016 permite a criação de Instituições Científicas, Tecnológicas e de Inovação (ICT) como órgãos públicos ou pessoas jurídicas de direito privado “sem fins lucrativos”, inclusive sob forma de Organizações Sociais (OS), bem como a criação de Núcleos de Inovação Tecnológica (NIT) de direito privado no interior das instituições públicas, para o desenvolvimento de atividades de pesquisa. Essas Instituições poderão:
i) receber recursos públicos dos entes federados e de fundações ditas “de apoio” para a cobertura de todas as suas despesas;
ii) utilizar de pessoal e recursos públicos em atividades de pesquisa para empresas privadas;
iii) utilizar infraestrutura e recursos públicos em atividades de pesquisa para empresas privadas.
A Lei 13.243/2016 implica em mudanças regressivas no Complexo Público de Ensino Superior e de Pesquisa Brasileiro, dentre as quais destacam-se:
I) aumento da transferência do fundo público para empresas privadas e substituição de instituições públicas (estatais) de pesquisa por OS, apontando para a diminuição de concursos públicos para a carreria de professores universitários e pesquisadores;
II) docentes e pesquisadores das instituições públicas (estatais) poderão assumir funções de diretores/presidentes de OS que desenvolvam atividades de pesquisa e inovação tecnológica, auferindo rendimentos por atividades realizadas nos setores público e privado. Isso impactará negativamente o trabalho de docência e de pesquisa, principalmente o regime de Dedicação Exclusiva (DE);
III) professores e pesquisadores pagos com recursos públicos poderão atuar em empresas, podendo resultar num aparente crescimento das atividades de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) como “inovação”, porém tendo em vista interesses privados;
IV) o Estado poderá até ampliar seus gastos, ao passo que as empresas tenderão a diminuí-los, uma vez que terão acesso a recursos estatais (financeiro e de pessoal);
V) o número de patentes registradas pelas instituições públicas tende a cair, pois o registro passará a ser feito em nome dos envolvidos no processo e da OS a que eles estarão ligados. A fonte de recursos para a manutenção dos registros continuará a mesma, os cofres públicos, enquanto a apropriação dos benefícios será privada.
VI) a produção científica e tecnológica pública será direcionada por demandas do mercado, com prejuízos das atividades de C&T em áreas não rentáveis e fundamentalmente nas de ciência básicas e de ciências humanas.
Deve-se salientar, ainda, que a Lei 13.243/2016 fere também o princípio constitucional de publicidade, direito de acesso público ao conhecimento gerado pelas Instituições de Ciência e Tecnologia, inclusive prevendo sanções administrativas, civis e penais aos servidores que não aderirem aos acordos firmados nas instituições onde trabalham. Com a implantação dessa lei, o Estado ficará vulnerável aos interesses particulares, pois os recursos públicos poderão ser apropriados por interesses privados.
As consequências referidas anteriormente nada mais são que a materialização da Refora do Estado capitaneada por Bresse-Pereira nos anos de 1990, no governo de FHC e levada adiante por sucessivos governos. Segundo essa reforma, a responsabilidade pelos “serviços sociais e científicos” para a ser das OS, organizações “públicas não-estatais”.
Pelo exposto, a Lei 13.243/2016 desfecha ataque ao Complexo Público de Ensino Superior e de Pesquisa e representa grave ameaça aos interesses da maioria da sociedade em favor de interesses privados, bem como aponta para a destruição da capacidade nacinal de produção de C&T de interesse público.
Faz-se , pois, necessária uma vigorosa mobilização contra esse “Marco Legal de CT&I” e em defesa da produção científica e tecnológica que responda às necessidades e aos problemas vividos pela maioria da sociedade brasileira.
Para fazer frente às ameaças que o referido “Marco” representa, os signatários deste Manifesto convidam os setores organizados da sociedade civil para participarem do Movimento pela Ciência e Tecnologia Públicas.
Signatários:
Adunesp -Associação dos Docentes da Unesp
Adunicamp Associação dos Docentes da Unicamp
Adusp – Associação dos Docentes da USP`
APqC – Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo
Mandatodo Vereador Pedro Tourinho (PT Campinas)
Sinpaf – Sindicato dos Trabalhadores de Pesquisa e Desenvolvimento Agropecuário – Seção Sindical Campinas e Jaguariúna
STU – Sindicato dos Trabalhadores da Unicamp
Sintusp – Sindicato dos Trabalhadores da USP