Toninho Alves* e Renato Fernandes, Campinas/SP
Em uma entrevista para a TV francesa, dois médicos e pesquisadores franceses que estão trabalhando com a possibilidade da vacina BCG (Bacillus Calmette-Guerin) agir contra o Coronavírus, afirmaram: “[…] não deveríamos fazer um estudo na África onde eles não têm máscaras, tratamentos ou reanimação? Isso é feito em estudos sobre AIDS, onde prostitutas são usadas para testar certas coisas, porque sabem que são altamente expostas e não têm proteção”.
Essas afirmações geraram revolta em personalidades do mundo do futebol, como Drogba, Eto’o e Demba Ba, e também nos movimentos negros.
Porém, as afirmações não são um “deslize” ou um “acaso”. Elas se constituem como mais uma marca do racismo estrutural que atravessa não só as sociedades nacionais, mas também o mundo. Historicamente, se utiliza a ciência para subjulgar o povo africano. Isso se dá desde o período da escravidão, até os tempos atuais.
Antes de tudo, a França é um país imperialista que no fim do século XIX e até meados do século XX invadiu, exterminou, explorou e roubou as riquezas e os povos africanos: foi assim na Argélia, no Senegal, em Mali, no Marrocos, na Tunísia, Gabão, Togo, Camarões, entre outros países – o império colonial francês se estendeu para outras regiões como a América e a Ásia e continua em alguns casos (Guiana Francesa, a Ilha de Reunião, etc.).
Esse domínio gerou diversos massacres. Um dos mais conhecidos aconteceu em 1945, nas cidades de Sétif e Guelma na Argélia, com cerca de 45 mil mortos. Um ano antes, no Senegal, já havia ocorrido um massacre com soldados senegaleses que lutavam junto aos franceses na Segunda Guerra Mundial, conhecido como o massacre de Thiaroye.
Mesmo com a descolonização, a partir do fim da Segunda Guerra, a França continua sua ação imperialista pelo domínio indireto da economia e da política, a chamada partilha da África. Por exemplo, desde 2013, as tropas francesas estão presentes no Mali.
Por outro lado, com o avanço das doenças e da indústria farmacêutica, ocorreu um avanço generalizado dos testes de medicamentos nos países do Sul global, especialmente na África. Como os próprios médicos racistas citaram os testes com medicamentos anti-HIV, ebola dentre outras, já ocorreram na África, em países como Camarões, desprezando a vida e qualquer limite ético, visto que muitas das vítimas não sabiam nem o que estavam tomando.
Todo esse período de dominação gerou uma mentalidade imperialista e racista na sociedade francesa de desprezo pela vida dos africanos. Um racismo estrutural que se expressa na visão dos médicos franceses de tratarem os africanos como um “só povo”, desprezando a diversidade étnico-cultural do continente, e como “cobaias”, como a carne mais barata do mercado, pobres que não têm nada a perder, visto que por terem tidos suas riquezas roubadas (que continuam a ser pela exploração imperialista), não terão os “equipamentos médicos” necessários para evitar a proliferação do Coronavírus.
Não é disso que nossos irmãos africanos necessitam. Eles necessitam que as dívidas externas que sufocam suas economias sejam anuladas e que as riquezas roubadas pelos países europeus sejam devolvidas.
* Toninho Alves é pré-candidato do Psol a Prefeitura de Campinas, SP.
Fonte: Esquerda Diário